Já não me emocionam verdadeiramente estas dramatizações em torno da coisa política. Percebo que vivo num país no qual a liberdade gera descoordenação, desigualdade e ressentimentos. Não há fraternidade entre os portugueses, ou se a há é a de irmãos desavindos. Vivo num país desmemoriado das suas humilhações às mãos da Europa, e que decidiu persistir num matrimónio que trouxe um dote efémero a troco da perda permanente da independência. Esperamos molemente um caudilho que nos leve daqui não se sabe para onde. Somos a caricatura crepuscular de uma nação.
Por mim, vou vibrando com as coisas pequenas da minha domesticidade e esquecendo esses alaridos que acabam em rotatividade democrática, ou seja na alternância de cabos partidários e suas clientelas, num eterno retorno sem muita erosão. Se isso é a "nação", não contem comigo. Roubem-me o esforço e o dinheiro; a saúde e a consciência, não.
Folheio os livros recém-chegados, revejo fotos a sépia, lembro-me de coisas – incluindo aquelas que me disseram para eu acreditar. Aprendo lentamente que a vida é pouco mais do que o esmagamento metódico dos sonhos em que fomos criados e formados – os sonhos pessoais, mas também os sonhos colectivos, os cívicos. Devíamos ser ensinados a não sonhar, ou a não sonhar senão naquilo que está ao nosso alcance pessoal e sob nosso controle individual; não devíamos ser condenados a uma vida inteira de aprendizagem pírrica dessa elementaridade. Mas talvez isso subvertesse demasiado a nossa fidelidade cívica, talvez nos tornasse demasiado felizes, ou livres, ou sábios; talvez nos privasse das vantagens – ou das esmolas – que nos dão por vivermos em manada.
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