Agora que a Europa (ou ao menos parte dela) atravessa uma época crepuscular, vale a pena reconhecer que poucos foram, ao longo da História, aqueles que perceberam verdadeiramente a chegada do ocaso – e menos ainda aqueles que, sem entusiasmo profético, perceberam o que havia para lá do maremoto que se acastelava no horizonte do declínio.
Um foi Voltaire.
Em 2 de Abril de 1764, escrevendo ao marquês de Chauvelin, pressagia uma revolução que o invocaria com demasiada frequência, como um estandarte relutante:
"Tout ce que je vois jette les semences d'une révolution qui arrivera immanquablement, et dont je n'aurai pas le plaisir d'être témoin. Les Français arrivent tard à tout, mais enfin ils arrivent. La lumière s'est tellement répandue de proche en proche, qu'on éclatera à la première occasion; et alors ce sera un beau tapage."
Em 25 de Agosto de 1766, em carta a Damilaville, adivinha as ironias históricas do processo que se adensava, pressente a voragem que o arrastaria postumamente, a inelutabilidade dos factos devorando as ideias, o holocausto do patrocínio intelectual às mãos dos "va-nu-pieds":
"Je vois que les philosophes seront toujours de malheureux êtres isolés qu'on dévorera les uns après les autres, sans qu'ils s'unissent pour se secourir. Sauve qui peut! sera la devise de ce commun naufrage. Les persécuteurs finiront par avoir raison, et la plus pure portion du genre humain sera à la fois sous le couteau et dans le mépris."
Há inteligências que pressentem privilegiadamente; e que, ao fazê-lo, transformam os seus presságios nas sacudidelas telúricas com que o futuro se impõe.
Faltavam ainda mais de vinte anos para a Revolução; quase trinta anos para o Terror.
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