Da Patagonia ao Peru


Ele surpreendeu-se, na conversa que mantínhamos, com o meu conhecimento e interesse pelas paragens inóspitas que ele tinha calcorreado recentemente: o Monte Fitz Roy, o Cerro Torre (mas eu tinha lido Lionel Terray e Cesare Maestri!) e outras glórias locais, desde o Perito Moreno às Torres e aos "Cornos" del Paine, sem esquecer esse casulo modernista e luxuoso que é o "Explora Patagonia", com vista precisamente para os supracitados "cornos" del Paine.
Ele não sabia que a minha imaginação anda há muito enamorada dessa topografia rebelde, e de uma tradição mística que desce das alturas até às pampas em busca do seu karma. Vai para norte e cruza a rota dos gauderíos (hoje gaúchos), empunhando esse roteiro proto-iluminista que é El Lazarillo de Ciegos Caminantes desde Buenos-Ayres Hasta Lima, atardando-se na contemplação de novas cordilheiras e no eco distante de gritos e entoações propiciatórias incas.
A minha imaginação prende-se ainda à releitura exaltada e penitente de The Bridge of San Luis Rey, remirando de novo os picos gelados e espectrais de que partiu, e sorve cautelosamente os regatos franciscanos em que Thornton Wilder parece ter embebido a sua pluma: "Strict Puritans imagine God all too easily as a petty schoolmaster who minutely weights guilt against merit, and they overlook God's «Caritas» which is more all-encompassing and powerful. God's love has to transcend his just retribution"; a Parábola dos Trabalhadores na Vinha sublimemente resumida, em suma.
Insondáveis desígnios, os dessa Providência que amalgama emoção topográfica e sabedoria tipografada - e com ambas debica as asas da imaginação, ao Sol singularmente oblíquo da Patagónia.

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