Houve tempo em que as remontas desciam placidamente do poio beneditino até ao Chafariz da Esperança, para abeberarem água de sêmea e tomarem penso.
Bons tempos.
Hoje a água tem que subir a rampa até aos Poiais, que falta o fôlego para a deslocação. Mas não vai encanada, que isso é muito plebeu; vai em muito selectas garrafinhas.
E assim é que nas Cortes se bebe água, mas do gargalo, que a da torneira sai, diz-se, mais cara, essencialmente porque é a água que tem que chegar à boca do deputado, e não vice-versa – ora, continua o argumento, isso postula a presença de funcionários aguadeiros (ou na versão mais solene, "bedéis aquários", ou na versão mais chique, "maîtres-verseaus"), e um vultuoso investimento em vasilhame.
O argumento passa por uma comparação entre os custos fixos da operação de trasfega do líquido da torneira até aos beiços sôfregos, por um lado, e os custos variáveis das garrafinhas – esquecendo que o primeiro é um custo único e o outro é recorrente, sendo portanto o primeiro amortizável. Mas isso agora não interessa nada, que a garrafinha sempre rende uma "margem"...
E que tal deixar de fornecer água nas Cortes? Assim, o deputado ressequido poderia talvez alçar o rabo para outro efeito que não o de votar, e arrastar o seu arcaboiço, já não digo até ao supra-mencionado chafariz, mas ao menos até a uma torneira nos Passos Perdidos (que poderiam até ser rebaptizados como "Bebedouros Reencontrados").
Seja.
De tudo isto retivemos duas coisas notáveis:
1) Em matéria de água, nas Cortes emborca-se mais do que em Timbuktu antes de uma travessia do deserto;
2) A tabela periódica dos elementos tem que ser revista para se incluir lá uma nova matéria super-pesada, o glúteo do deputado – talvez o elemento GV, "gluteus vicarii".
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